domingo, 23 de agosto de 2020

Numa entrevista, o Woody Allen referiu este Lumet como um dos seus filmes favoritos de sempre. Sim, sim, de sempre. Numa resposta que inclui os familiares "A Grande Ilusão", "Ladrões de Bicicletas", "Rashomon", "O Sétimo Selo", "Morangos Silvestres", "Os 400 Golpes" e "A Regra do Jogo", surge este filme inusitadamente mencionado, o qual o cineasta americano reconhece como pouco conhecido. Claro que fui atrás.

É como se o Orson Welles filmasse o "Brute Force" do Dassin numa prisão militar no deserto. As grandes angulares a distorcerem os rostos dos guardas e prisioneiros de maneira grotesca, os contra-picados a encurralarem as personagens contra tectos desgastados e paredes humedecidas, os planos-sequência a exporem as várias camadas de acção em grande profundidade de campo (se aquela primeira cena não foi inspirada na inicial do "Touch of Evil", então não sei em que foi), tudo isto denuncia uma filiação com Welles.

Mas a Lumet interessa a dor, a transpiração, a exaustão física e psicológica a que o grupo de prisioneiros vai sendo sujeitado nas punições sádicas confundidas com protocolos disciplinares, como as sucessivas escaladas sisifianas da colina do título, catalisadoras do medo, da morte e da loucura. A autoridade é tão asfixiante como o calor daquele meio, o qual Lumet transmite pelos ofuscantes lens flares, pelas texturas das peles tressuadas dos actores e pelo barulho dos mosquitos e cigarras na banda de som. E é neste estabelecimento marcado pelo racismo, pela humilhação e pela violência que a personagem intrépida e resiliente de Sean Connery é tornada em enorme figura de calvário, numa intensa obra cinematográfica que denuncia as práticas mais abjectas e cruéis do Exército.

Se é um dos maiores filmes de sempre, não sei. Mas, pelo menos, prova duas coisas (como se dúvidas houvesse). Primeira, que Lumet dominava em todos os aspectos a gramática cinematográfica. Segunda, que Sean Connery foi (e é), pelo magnetismo da sua personalidade única, um dos maiores actores da História do Cinema. Este último fará 90 anos depois de amanhã. Aproveitemos para recordá-lo evocando grandes filmes como este.


The Hill (1965), Sidney Lumet

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